quarta-feira, janeiro 10, 2007

COSTUMES E TRADIÇÕES

"São muitos os costumes, valores e tradições, que, ao longo do tempo, vão se perpetuando, desaparecendo, ou até mesmo sendo substituídos por outros. Mudanças ocorreram e continuam a acontecer nos diversos setores da sociedade, em ritmo cada vez mais rápido. E, com isto, muda a moral e certos padrões de comportamento são abandonados, superados ou substituídos. Vivemos, hoje, numa sociedade de consumo, onde prevalece a vontade de ter sempre mais, de consumir sempre mais, de poder sempre mais. E só uma pequena quantidade de pessoas consegue isto. A maioria do povo não.
Como parte deste contexto, vejamos como eram no passado alguns aspectos da vida das pessoas e da comunidade de Boa Saúde. Muita coisa era diferente dos dias de hoje. Ocorreram grandes transformações.


A Instrução ou Educação Escolar

Em Boa Saúde, como geralmente nas demais comunidades do interior, a escola do passado era muito diferente da atual, a começar pela matrícula. As crianças somente eram aceitas na escola aos sete anos de idade. Eram divididas em classes por sexo: menino não se misturava com menina. O estudo de português era iniciado através da Carta de ABC e o método era o “beabá”. As principais tarefas escolares, em relação ao aprendizado da língua, eram: caligrafia, que consistia em repetir uma frase várias vezes, caprichando na letra; cópia de determinado texto do livro de leitura; ditado de texto ou de palavras e leitura em voz alta, observando a pontuação.
O estudo de matemática começava com a tabuada. O aluno tinha que decorar as operações de somar (adição), subtrair (subtração), multiplicar (multiplicação) e dividir (divisão) e responder, quando “arguído” pelo professor, de maneira quase cantada. Geralmente uma vez por semana, era realizado um tipo de exercício de matemática, denominado de “argumento”, no qual eram feitas perguntas pelo professor aos alunos sobre a tabuada. Quem não acertava a resposta era castigado com a palmatória (objeto de madeira, de forma circular e com um cabo, que servia para bater repetidas vezes nas mãos).
No início e no final das aulas, todos os alunos cantavam o hino nacional ou, dependendo da data , o hino à bandeira ou, ainda, à independência. Em algumas datas festivas eram realizados passeios escolares aos sítios e fazendas. A Fazenda D. Pedro II, conhecida, também, como Boa Esperança, de propriedade do Sr. Abel Viana, naquela época, era um dos locais preferidos para os tais passeios.
O respeito e a obediência aos mestres eram observados com um certo rigor. Os alunos eram punidos quando não cumpriam as tarefas ou desrespeitavam os professores. Dependendo da gravidade do fato, o castigo seria ficar de pé diante dos colegas, durante muito tempo, ou ficar de joelhos, muitas vezes em cima de caroços de milho.
As condições da escola eram diferentes, também, em relação aos seguintes aspectos: não existiam carteiras individuais; não havia distribuição de livro gratuito; nem o fornecimento de merenda escolar.


Festas Religiosas e Festejos Populares

São muitas as festas religiosas e vários os festejos populares, que, no passado como hoje, fazem parte da nossa cultura. São inúmeras as crenças, as lendas, as superstições, os provérbios, as adivinhações, as cantigas de roda, as danças, que fazem parte da sabedoria popular e do nosso folclore.
Folclore é uma palavra de origem inglesa, cujo significado é: saber do povo. O dia 22 de agosto é comemorado como o Dia Mundial do Folclore.
Com o desaparecimento do modo de vida tradicional no meio rural e no meio urbano, muitas manifestações folclóricas, também, vão desaparecendo, ou cedendo lugar a um folclore artificial, voltado para o turismo, na forma de danças e representações dramáticas executadas por grupos profissionais.

A Quaresma e a Semana Santa

Na quaresma (período compreendido entre a quarta feira de cinzas e o domingo de ramos), em Boa Saúde, duas vezes por semana era rezada a Via-Sacra, ato religioso que representa o sacrifício de Jesus, desde o calvário até a morte e ressurreição.
A Semana Santa era comemorada com muito respeito e algumas superstições.
Começando com o “domingo de ramos”, como ainda hoje, as pessoas levavam ramos para serem benzidos na missa e depois guardados durante todo o ano para servirem como proteção, principalmente, nos casos de tempestades. Na “quarta feira de trevas”, não se devia varrer a casa, não se devia comer doce, não se devia tomar banho, nem pentear os cabelos, pelo temor de receber o castigo de ficar entrevado.
Na quinta e sexta-feira santa, faziam-se, com mais fervor, penitências e jejum. O peixe, nesses dias, era o alimento obrigatório, diferente dos dias de hoje, que continua sendo prescrito pela igreja, apenas, para a sexta-feira. Era um costume do passado, a troca de alimentos entre as famílias mais abastadas e a doação de esmolas, por parte destas, às mais pobres.
No sábado de aleluia, depois da meia noite, era uma tradição o roubo de galinhas, que eram torradas e comidas na madrugada, no ritual do “rompimento da aleluia”, com a malhação de Judas, um boneco do tamanho de uma pessoa, feito com roupas usadas, e enchimento de palha ou rama de melão de “São Caetano” e a cabeça improvisada com um cabaço. O judas era carregado pelas ruas, apedrejado e queimado, vingando-se assim do discípulo traidor de Cristo.


Os Festejos Juninos

As festas juninas, em Boa Saúde, como em todo o interior do Nordeste, reúnem uma série de costumes populares. No passado, como ainda hoje, embora com menos intensidade, as fogueiras eram acesas em frente às residências, às vésperas do dia dedicado a cada santo: 12 de junho, Santo Antônio; 23 de junho, São João e 28 de junho, São Pedro.
Na véspera de Santo Antônio, considerado o santo casamenteiro, as moças faziam preces e simpatias, com o objetivo de saber o nome e as características do futuro noivo ou marido. Era comum as crianças ou jovens tomarem as pessoas mais idosas como padrinhos de fogueira, num ritual em que se dizia três vezes: “São João disse e São Pedro confirmou, que o senhor fosse meu padrinho (o futuro padrinho respondia), e você meu afilhado, que Jesus Cristo mandou” .
Eram assadas espigas de milho na fogueira e servidas comidas típicas: milho verde cozido em espiga, pamonha, canjica, bolo de milho, bolo preto, ou “pé-de-moleque”, além de outras gulozeimas.
As novenas eram rezadas ou cantadas, geralmente ao pé do oratório, e, no terreiro, soltavam-se foguetões e outros tipos de fogos: bomba, traque, estrelinha, chuveiro, “mijão”. A meninada gostava de colocar uma bomba debaixo de uma lata e ficava esperando o estouro e a lata “voar” em bandas.
Completando os festejos, não faltavam as músicas e os bailes juninos. A palavra forró, no passado, não era muito aceita, sendo considerada como não familiar. As quadrilhas eram bem marcadas, com os participantes caracterizados de matutos e a cerimônia do casamento tendo como personagens principais: os noivos, pais e padrinhos, o padre e o delegado, visto que a noiva casava, sempre, grávida.


As Novenas

Além das festas juninas, era tradicional festejar com novenas, leilões e bailes, as datas dedicadas aos santos de maior devoção, como: São Sebastião, protetor contra a peste, a fome e a guerra, no dia 20 de janeiro; São José, protetor dos agricultores, no dia l9 de março; Nossa Senhora da Conceição, no dia 8 de dezembro e Santa Luzia, protetora dos olhos, no dia 13 de dezembro.
Durante o mês de maio, dedicado a Virgem Maria, cada noite era patrocinada por uma família ou grupo de pessoas da comunidade: comerciantes, estudantes, agricultores, etc. A igreja era enfeitada com muitas flores, crianças eram vestidas como anjos e as novenas assumiam um caráter solene e festivo, com ladainhas e cânticos a Nossa Senhora. Era comum soltar muitos fogos, principalmente no último dia de maio, quando eram realizadas a coroação de Nossa Senhora e a queima das flores que foram usadas durante o mês.
Não somente nas cidades, mas nos principais sítios, comemorava-se o mês de maio. Era costume, em algumas localidades, não iniciar as novenas no dia primeiro do mês, começando dias depois, para não haver coincidência no encerramento, nas comunidades mais próximas. Nestes casos, prolongavam-se o encerramento das novenas pelos primeiros dias de junho, com a realização de leilões e bailes em várias localidades.


As Noites de Natal e de Ano Novo

O Natal era festejado, no passado, tendo a missa da meia noite, ou “missa do galo”, como o principal acontecimento. Não se falava em Papai Noel. Era uma figura quase desconhecida no interior, naquela época. Era pouco comum a troca de cartões e de presentes.
Na esperada Noite de Natal, enquanto se aguardava a celebração da missa, ficava-se conversando nas calçadas ou “passeava-se” na rua, num vai e vem, quase interminável, com uma parada nos “botequins”, que eram uma espécie de barracas de pequenas dimensões,
cobertas de palha. Ali saboreava-se as

Penina Dias Vieira

diversas comidas típicas da época: castanha de caju em forma de rosário, bolos diversos, arroz doce, sequilho e “raiva”, que eram produzidos por Maria Nicolau, Rita de Lino, Alice Bezerra, Bagre (de Guarani) e outras fazedeiras de vendagens. Para beber, além de café e guaraná, encontrava-se cachaça, ginebra “Gato Preto”, quinado e conhaque de “São João da Barra”.
As pessoas tinham, quase como uma obrigação, o costume de vestir roupa nova por ocasião da Festa do Natal . Como, naquela época, não existia roupa pronta (confecções), comprava-se o pano (tecido) e, quando não se costurava em casa, levava-se para as costureiras. Nas décadas de l950/60, as principais costureiras de Boa Saúde eram : Maria do Rosário Bezerra, que costurava todo tipo de roupa, mas era especialista em confecções masculinas; Maria Medeiros e Celsa de Medeiros Paiva, que preferiam costurar roupas femininas, e Penina Dias Vieira, que gostava e fazia, como ninguém, Penina Dias Vieira
roupas para crianças e noivas. Além de costureira, Penina era também florista. Fazia “cachos” e “capelas “ para noivas, recebendo encomendas, inclusive, de municípios vizinhos.
O ano novo era pouco comemorado em Boa Saúde. Muitas pessoas iam passar a “Festa de Ano” em Nova Cruz ou Brejinho. Já por ocasião da “Festa de Reis”, preferiam se deslocar para São José de Campestre .

O Carnaval

Por ocasião do carnaval, em Boa Saúde, realizavam-se bailes, ao som da sanfona de Dioclécio, e a brincadeira do entrudo, na qual as pessoas molhavam umas as outras, dando verdadeiros banhos, e quanto mais de surpresa, mais engraçado. Grupos de “papangu” mascarados percorriam as ruas, ocasião em que os homens se vestiam de mulher. Como não existia batucada, nem charanga, as marchinhas eram acompanhadas batendo-se em latas. Maria Júlio era uma das pessoas que gostava de animar o carnaval. Num determinado ano organizou um bloco, o Riso da Noite, que chegou a ganhar um concurso.

Os Entretenimentos

Em se tratando de costumes e tradições, não podem ser esquecidas algumas modalidades de folguedos populares, como o boi-de-rei e o João Redondo.
Os moradores mais antigos lembram os bois-de-rei que geralmente se apresentavam em Boa Saúde e nas localidades vizinhas; eram originários da Lagoa do Espinho, do Córrego de São Mateus e do sítio Gatos, do qual o senhor João Porfírio dos Santos era um dos figurantes, denominado de Birico, o que lhe valeu o apelido até hoje.
João Porfírio dos Santos – João BiricoO grupo que brinca o boi-de-rei é composto, geralmente, por l7 homens,

João Porfício dos Santos (João Birico)

incluindo os tocadores. Os figurantes - mestre, galantes e damas - se vestem com trajes enfeitados com fitas de todas as cores e espelhos, nas cabeças colocam adornos em forma de coroa e nas mãos conduzem espadas. Os outros: Mateus e Birico (vaqueiros) e Catirina vestem roupas usadas, pintam os rostos com tisna e fazem a parte cômica do espetáculo.
Iniciando a brincadeira, os componentes do boi-de-rei, acompanhados pelos tocadores de rabeca, sanfona e pandeiro, entoam cânticos saudando os donos da casa e a assistência, seguidos de canções de louvor ao Menino Deus, aos santos e objetos sagrados, dançando, fazendo evoluções e sapateados.
O boi é a principal figura da brincadeira, da qual fazem parte: o jaraguá, uma espécie de pássaro do pescoço bem cumprido, o guriatã, o urso (leurso), a burrinha. Além dos aboios e das canções dedicadas ao boi, para cada uma das outras figuras existem canções apropriadas.
O teatro de bonecos é originário da Ásia, de onde foi trazido para a Europa e depois para o Brasil, recebendo as denominações de Mamulengo e João Redondo, no Nordeste do Brasil. A palavra “Mamulengo derivaria de mão molenga, a maneira do apresentador manipular os bonecos sobre a tolda, enquanto João Redondo, por extensão, seria alusão a uma coleção de bonecos que certo escravo fizera, para divertir os companheiros, no meio da qual se destacava um boneco gordinho e arredondado, imitando o dono da fazenda, boneco que passou a se chamar Capitão João Redondo e a dar nome a toda a brincadeira” ( Gurgel, 1999, p.137 – 138).
Brincadeira conhecida em todo o Nordeste brasileiro, o João Redondo, apresentava-se com bastante frequência em Boa Saúde e na vizinhança. Consiste em um drama, cujos personagens são representados por bonecos que se movimentam e falam através de uma única pessoa colocada por trás de uma tolda de tecido estampado. “O homem que manipula os bonecos do João Redondo recebe as mais diversas denominações: de mamulengueiro, em Pernambuco; titereiro em Pernambuco e Paraíba; calungueiro no Rio Grande do Norte” (Gurgel, 1999, p.139).
José Caboclo e João Gregório foram os principais apresentadores de João Redondo, em Boa Saúde, e Manoel Luiz, em Córrego de São Mateus.


A Literatura de Cordel e os Violeiros

Os folhetos de cordel, conhecidos também como versos de feira, eram, com muita frequência, encontrados nas feiras do interior, vendidos por pessoas que os divulgavam sob a forma de cantoria. Os temas mais usados e apreciados eram: estórias de animais; batalhas e pelejas; romances e contos de fadas e de realeza; acontecimentos e tragédias; fatos religiosos.
Os violeiros ou cantadores de viola apresentavam-se em duplas que cantavam os temas da literatura de cordel, geralmente atendendo aos pedidos da assistência.
Em Boa Saúde além dos versos de feira, os violeiros travavam verdadeiros duelos sob a forma de cantoria, tendo como local a sala ou o terreiro das casas das pessoas que os convidavam, com datas previamente marcadas e que se realizavam às noites. Além dos versos de cordel, cantavam de improviso diferentes gêneros: pelejas, louvação, repentes, galopes e motes, atendendo aos pedidos dos presentes que, em agradecimento, colocavam dinheiro em um prato que ficava no centro da sala. Os violeiros que se apresentavam em Boa Saúde na década de 1940, tinham como principal ponto de encontro a residência do Senhor Cirilo Carolino Alencar. Nomes como: Macário, de Currais Novos; Tomaz de Aquino, de Vera Cruz e Nestor Marinho, de Nova Cruz, ainda hoje são lembrados pelos moradores mais antigos.


As Brincadeiras

No passado, eram muitas as brincadeiras realizadas pelas crianças e pelos adolescentes e que, com o passar do tempo, vão caindo no esquecimento.
Brincava-se com frequência de corrida de saco, corrida de jumento, pau de sebo, gato no pote, jogo de peteca, jogo de castanha, esconde-esconde, peia quente, bandeirinha, tica, remandinha, bunda –canastra, pula corda e passagem de anel.
Gato no pote Além dessas brincadeiras, outros divertimentos preferidos eram as adivinhações e histórias da carochinha e de trancoso que, quase sempre, tinham como personagens reis, rainhas, príncipes e princesas, quando não versavam sobre temas de assombração.
Lembram os mais velhos que um dos principais contadores de estórias, em Boa Saúde, era o senhor Manoel Bernardino, que gostava de relatar, com detalhes, contos de castelos e reinados.


Visagens ou Assombrações

Nos tempos passados, facilmente, acreditava-se em visagens ou assombrações, que apareciam ou vagavam em determinados lugares, quase sempre à meia noite. Em Boa Saúde,não era diferente. Além das estórias de aparições de almas nas segundas-feiras, contavam-se outras de assombrações, tais como:
- Lobisomem – Contava-se que um homem se transformava em lobo, vagava nas noites de lua cheia e perseguia as pessoas que ousassem enfrentá-lo.
- Burra-do-padre ou mula sem cabeça – animal que, quando se deslocava de um lugar para outro, fazia barulho causado pelas correntes que a aprisionavam..
- Choro-do-pagão – Existia uma crença de que criança que morria sem ser batizada era enterrada numa encruzilhada. Ouvir o seu choro à noite era como receber um pedido para ser batizada.
- Caipora – Pensava-se ser uma entidade que vivia nas matas e nos campos, espantando os animais e dando nó na cauda dos cavalos. Fumava cachimbo, e por isto, os caçadores deveriam conduzir fumo de rolo para oferecer-lhe e não serem incomodados.
- Papafigo – Acreditava-se ser um velho que andava durante o dia percorrendo caminhos e estradas, à procura de crianças para tirar-lhes o fígado. Por isso era muito temido por elas.
- Bicho-papão: Expressões como: “o bicho-papão vem te pegar” ou “ lá vem o bicho-papão” eram dirigidas às crianças para evitar traquinagens e obter bom comportamento. Apesar de assustar tanto, não se tinha idéia de como seria a figura do bicho.


O Artesanato

Atualmente, o artesanato é produzido mais como artigo de decoração e suvenir, enquanto no passado era voltado, quase com exclusividade, para atender às necessidades do consumo doméstico.
Em Boa Saúde, no início do povoamento, o Senhor Antônio Badamero produzia móveis rústicos, tais como: cama de

Maria Nair de Noura (Maria Afonso)

couro e madeira, mesas, bancos e tamboretes. Mais recentemente, o Senhor Manoel Matias fabricava vários tipos de móveis e objetos de madeira. O atual andor da procissão de Nossa Senhora da Saúde é uma das peças de madeira produzidas por ele.
Do barro de louça ou argila faziam-se uma variedade de vasilhas de
utilidade doméstica, principalmente na cozinha: panelas, caco de torrar café, cuscuseira, caco de fazer tapioca, alguidar, potes, tinas, jarras e muitos outros objetos.
À arte de trabalhar o barro de louça dedicavam-se, geralmente, as mulheres e sempre passava de mãe para filha. As principais louceiras de Boa Saúde foram Belina e Chiquinha Louceira.
A argila era, como ainda hoje, muito utilizada para fazer tijolos e telhas para a construção. As pessoas costumavam fazer “arrelia” (se reunir), para “bater” e queimar tijolos e, também, para os trabalhos de construção de suas casas, trocando dias de “serviço”.
Além das vasilhas de barro, outras eram feitas de cabaço: cuias de variados tamanhos, cumbuca e o próprio cabaço para conduzir água para o roçado.
Da palha da carnaúba eram produzidos chapéus, esteiras, sacas, vassouras, espanadores, abanos e outros artigos que eram vendidos nas feiras. Usavam-se as esteiras para forrar os paióis de farinha, para servir de cama ou mesa, quando colocadas no chão com estas finalidades.
A arte dos ferreiros era, também, de grande utilidade para as comunidades do interior. Em Boa Saúde, o senhor Severino Justino de Oliveira, que por conta do seu ofício era chamado de Severino Foguista, em sua oficina produzia: escarinhador e enxada de campinadeira, esporas, peças para arreio, estribo, marcas de ferrar gado, armadores de rede, alavancas e outros objetos. Além de produzir, ainda “apontava” ou afiava os instrumentos de trabalho, quando gastos, deixando-os prontos para serem usados novamente. Outro ferreiro que prestou muito serviço à comunidade foi Abílio Ferreira da Silva, que quase não trabalha mais por falta de encomenda. Os produtos industrializados substituíram o que era produzido artesanalmente pelos ferreiros.
Outro artesanato que está desaparecendo é a renda de almofada, um trabalho que passava de mãe para filha e que ainda existe em Boa Saúde, graças à persistência e dedicação de pessoas como a senhora Maria Nair de Moura. Mais conhecida como Maria Afonso, aos 89 anos, ela não deixa a sua almofada de bilros por nada.


A Culinária

Nos dias atuais, a caça e a pesca pouco contribuem para a alimentação da população. De um modo geral, grande parte dos alimentos mais consumidos em Boa Saúde ainda são originários da sua produção agrícola, da sua pecuária e da criação doméstica de aves. A base da alimentação da maioria da população é o feijão branco ou macaçá e a farinha de mandioca.
As formas de preparo dos alimentos não diferem muito das demais regiões do Estado. As carnes, geralmente, são preferidas torradas ou guisadas, sendo que a carne de sol é consumida assada na brasa, sob a forma de paçoca ou, ainda, cozida no feijão. Os principais pratos típicos preparados à base de carnes são: buchada de carneiro, picado (sarapatel), feito de vísceras de carneiro ou de porco, panelada, feita de mão-de-vaca ou outra carne bovina com osso. Os temperos usados são: pimenta do reino em pó, alho, cebola, colorau, vinagre, sal e cheiro verde (coentro e cebolinha).
Dependendo de determinadas datas e ocasiões, são preferidos alguns tipos de pratos:
- Na sexta-feira da paixão, o almoço é preparado à base de peixes, que são cozidos no leite de coco ou fritos, tendo como principais complementos pirão e arroz no coco.
- Pelo Natal, Ano Novo e por ocasião das festas de casamento, galinhas e perus são preparados sob as formas de assado e de guisado ou torrado. Os perus são “cevados” (alimentados) com antecedência, recebendo alimentação pelo bico, de maneira quase forçada até engordar.
- Após o parto, uma dieta muito usada era galinha “de chiqueiro” ou “capão” torrados, servidos com pirão.
- Durante os festejos juninos, faz parte das tradições o consumo de milho verde assado, cozido na palha ou ainda nas formas de bolos, pamonha e cangica, pratos que têm como um dos principais ingredientes o leite de coco. Fora da época junina, o milho é usado para fazer cuscuz, cangicão e mungunzá. Na região Agreste, a pamonha e o mungunzá são adoçados, enquanto em outras regiões, principalmente no Sertão, são salgados.
No passado, o beneficiamento do milho era feito em casa. Para fazer o cuscuz, o milho era colocado de molho na água e depois utilizava-se o moinho e a peneira para produzir a massa. Já o milho para o mungunzá era colocado no pilão, para “tirar o olho e a pele”. Para os grãos ficarem inteiros, colocava-se, juntamente com o milho no pilão, bucha de coco, na falta de palha de arroz.
O leite de gado, além do seu consumo depois de fervido, ou sob as formas de coalhada, mingaus para as crianças e papas para os mais idosos, é usado no preparo do arroz de leite, cuscuz, mungunzá e outros pratos, além da fabricação de queijos de manteiga e de coalho. Da nata do leite produz-se um tipo de manteiga, conhecida como de garrafa ou do sertão. O leite de cabra era muito usado para a fabricação de queijo de coalho. Acreditava-se que depois de iniciada a fabricação do queijo de manteiga, não podia chegar nenhuma pessoa estranha, pois a presença desta era o suficiente para colocar em risco a qualidade do produto. Faz parte da culinária da região uma variedade de alimentos provenientes do beneficiamento da mandioca. Além da farinha, que é consumida de várias maneiras, da goma produz-se: “grude”, beiju de forno, beiju seco, tapioca, “raiva” e sequilho. Da carimã ou mandioca mole, produz-se o bolo preto, ou “pé-de-moleque”, e outros tipos de bolos".

Texto do Livro: BOA SAÚDE - Origem e História
Autores: José Alaí de Souza e Maria de Deus Souza de Araújo

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